terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

New Journalism: perfil



A produção textual no formato de jornalismo literário requer o estudo das conceituações teóricas da comunicação devendo produzir a informação em consenso com a ideologia profissional e o querer mercadológico, além de escrever em conformidade com o público do veiculo que vai transmitir o material produzido. Na descrição de um perfil feminino, a prática de uma teoria literária em debate.




Muxoxos e trejeitos femininos


Alta, de pasta executiva negra como negros são seus cabelos, senta-se ao meu lado uma mulher que começa logo a dizer que se considera “mulher de atitude” porque se diz rápida no agir e porque tem pose de decidida. De aparência esquelética na vontade, mas na luta da balança, sua pele é clara sem ser translúcida. Parece ter lido meu pensamento ao fazer o gesto típico de quem precisa de protetor fator 30: o sol abrasante a faz apertar levemente os olhos e levar a mão à altura das sobrancelhas um tanto finas, mas marcantes por realçarem os olhos castanhos claros.
Rapidamente começa a falar como se fosse dado um sinal de largada em fórmula 1 sem o Rubinho. Para atropelar o tempo, começa a falar sobre si mesma, mas antes muda a postura um tanto encurvada para retesar a coluna e cruzar a perna esquerda sob a direita. Inicia um assunto com maestria de púlpito, de apresentação de palestra. Meu olhar observador a faz comentar que a postura causa às pessoas o sentido de uma maturidade, isso porque já sentiu muita incredulidade pela pouca idade que tem, ainda mais por exercer uma profissão com tanta concorrência como a sua.
Pelo comentário, noto sua vaidade pelo uso de acessórios que combinam com a saia de tecido leve, à altura do joelho e o terninho básico, num misto de verão e sobriedade, como se isso fosse possível. Continua a falar e diz que faz parte da postura cultivar as atuais manias das mulheres – temer a balança e serenar os cachos em constantes “chapinhas” – e ri com gosto num volume de igual tom da fala.
Na conversa, pude observar um e outro gesto de decisão, pela firmeza sentida, numa mescla complementada por um rosto de menina, ainda em formação.



Lembra da sua infância, lá no início! Conta com tranqüilidade ter sido fruto de uma gravidez sem planejamento. Quando sua mãe era estudante de medicina, a gravidez indesejada fez com que a primogênita fosse criada pela bisavó até os três anos, voltando para a mãe que já iniciava sua carreira de médica e futura empresária do agronegócio. Considera por isso e por outras atitudes no dia-a-dia, ter um exemplo de mulher persistente como mãe.
A essa altura relaxa a postura! Menos retesada demonstra estar à vontade no que conta. Quando adolescente acreditava ser a patinha feia e somente se deixou conquistar pelas pessoas quando já estava na faculdade. Faz uma careta leve e parece pensar alto ao dizer ter sido uma estudante concentrada com toda a sua formação que foi obtida numa escola particular. Complementa que, hoje em dia, carrega no semblante o orgulho de ser formada por uma universidade federal e de ter um bom domínio dos muitos encantos da advocacia, o que a faz acreditar ter escolhido uma das profissões de glamour e de oportunidades.
Pela correria profissional, diz que é difícil ter oportunidade de olhar para o céu aberto e que, por estar perto de tanto verde, podia estar era descalça, o que só não o fazia pelo compromisso seguinte que exigia estar de sapatos fechados! Podia continuar ali, calma, porque naquela altura do dia, bem merecia um chinelinho e ficar de bobeira dando milho aos pombos!
Atualmente, acredita ser uma mulher sem rotina, apesar de cumprir carga horária de três turnos por estar numa fase temporária por querer fazer de seu escritório, a principal tarefa profissional: enfrentando tribunais, ordenando tarefas e segura em reuniões com clientes.



Mas a inquietude é superior à completude dos que sonham!



Em seu desassossego diário, é professora de algumas disciplinas jurídicas e, noite após noite no ensino, acorda cedo para prestar serviços no escritório regional da ordem (dos Advogados). Em algum meio tempo, amadurece a decisão de um casamento que está prestes a realizar e ainda, diariamente, cultiva amizades pelo orkut, deixando uns recadinhos espontâneos que só o amigo entende.
Na vida sentimental confessa que, dos namorados passados, não tem lembranças ruins pois não guarda os rancores que a fizeram terminar a relação. Ainda mais que, sua reclamação era o tempo precioso gasto na conquista, nos vai e volta e nas diferenças de personalidade. Agora acredita ter encontrado sua alma gêmea por estar ao lado de uma pessoa que contribui na construção de sua personalidade transformadora, na solidificação de sua carreira e de ambos acreditarem terem encontrado um sócio para a vida.




Seu sorriso não lhe sai do rosto, mas não chama tanto a atenção quanto o movimento dos olhos que passeiam por todos os ângulos. Percebe-se que brilham quando a ‘briga’ é boa porque, ao falar de temas que gosta, fagulhas são lançadas. Quando o assunto tem relação com os direitos do consumidor, o que está envolvida desde a faculdade, volta a assumir uma postura firme, decidida e entendedora do assunto. Fala do seu voluntariado em uma associação de direitos do consumidor embalada pelo sonho de ver uma sociedade bem informada e conhecedora de seus direitos (com o código do consumidor no bolso).



Acredita na evolução dinâmica da vida e gosta muito de histórias de pessoas com personalidade transformadora, que viram a próxima esquina sem medo e sem freio.



Volta a relaxar ao conversarmos sobre livros, filmes...
... Lembra do filme Olga por representar a mulher que se dedica a um plano e se preciso for, gira 360º sem olhar para trás. Outro filme que considera bom é “Adeus Lênin”. Por este filme tem orgulho de tê-lo assistido nove vezes atraindo amigos para assistir consigo! Agüenta! Chupa essa manga – diz rindo com gosto e dispara dizendo que dá voltas e quilômetros para estar em companhia de um amigo, tomar um tereré, trocar idéias, receber ou dar conselhos, se preciso for.
Entre seus amigos estão os mais de dez primos, gente de sua faixa etária e de todas as idades que agüentam assistir filmes, falar de nada e de alguma coisa! Incluindo sua própria mãe, que também lhe pede conselhos advocatícios e administrativos, assunto que quer dominar cada vez mais gastando pestanas em seus livros (e por isso estuda com afinco).
Diz-se consciente de sua personalidade agitada e por isso se concentra, três vezes por semana, em aulas de ioga. Explica que a adrenalina combina consigo mas precisa dos ensinamentos para ajudar no equilíbrio da vida e para sua personalidade.
Vê-se, com percepção, que seu esporte radical preferido é a quebra da rotina e que exercitar ioga às seis horas da matina, é mais esporte do que filosofia!
Diz acreditar na existência da obstinação no caráter de todas as pessoas e que a maioria ama a transformação de suas vidas, mas continua no mesmo caminho pela segurança de suas rotinas!! – afirma com convicção e complementa que até em seus gesto existe certa contradição. Isso por ter uma personalidade agitada em oposição ao seu sonho de ser ponderada e tranqüila, de querer estar em lugares tranqüilos, como se sente agora e planejar ter ao lado, uma família perfeita, com marido, uma ninhada de filhos e uma casa confortável!
Nas poucas marcas do seu rosto, vincos de preocupação se vêem, na hora que fala do futuro, do desejo de atingir o equilíbrio na vida. Por isso, acredita em videntes, se preciso, faz consulta e parece crer piamente no que dizem, não como se fossem vaticínios, mas algo a considerar bem.
A empolgação no falar provavelmente a fez ter se esquecido das horas, que passaram muito rápido.
De repente, parece lembrar-se do compromisso no cartório, faz um gesto quase infantil com um muxoxo de bochechas, alisa a saia com rapidez e levanta-se com cara de quem enfrenta o mundo de bolsa e salto alto.
No ploc-ploc de passos miúdos e ligeiros, sai calçada afora e penso que é melhor nem interromper tanta pressa para perguntar qual seria seu nome.




Produção para a Disciplina de Jornalismo Literário da pós-graduação de Teorias e Práticas de Jornalismo Contemporâneo, Outubro/2007.

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